Grimes | Visions

Grimes

Vision

[4AD; 2012]

6.7

ENCONTRE:4AD

por Yuri de Castro; 07/02/2012

Esse texto é sobre um disco internacional. Mais precisamente, feito em Montreal. Mais precisamente ainda, a autora ganha notório espaço em seu país, uma vez que lançou um trabalho menos bruto se comparado aos que geraram a inicial reverberação do adjetivo “aposta” em cima de Claire Boucher. É estranho, mas as pessoas continuam a sentir saudade.

Montreal é a Vitória do Canadá. Como, certamente, você que está lendo este texto não é de Vitória, nem do Canadá, para quê essa referência? Essa pergunta deveria ser mais repetida. Não só pelo autor desse texto, mas por todos os bibliotecários de catálogos musicais do mundo. Digo isso porque a música do “vamos ver no que dá” é uma coqueluche promovida pelos netos do Napster, pelos irmãos do Mediashare. Se o produto desse bumba-meu-boi é bom ou ruim, pouco tem importado. Tem-se nichos. Logo, temos consumidores: de download, de faixa, de EP, de álbum, da arte do álbum, de show, da arte do show etc.

“Simplesmente aconteceu” e “a gente fez porque estávamos ali” é uma resposta corriqueira. Nunca se esteve tão perto do momento certo e do lugar certo. De repente, tudo pareceu propício. E é dessa forma que o ambiente carrega “Visions”. Claire Boucher, que já era uma espécie de prodígio da cena de Montreal, agora já tem certa repercussão. É natural – mas nem tanto. É natural porque tudo em Visions parece ter sido plantado na terra deste tempo: é pista de dança, mas não é dançante pra massa. É vibrante, mas soa não palatável. Não vai vender, mas vai gerar expectativa no próximo festival em que Boucher se apresentar sob seu pseudônimo Grimes.

O contrapeso aqui fica a gosto: Montreal é uma cidade tão interessante quanto incapaz de trazer felicidade a quem a visita. Tal como Vitória, absorve com recalque aspirações vizinhas. E, talvez, soe até mais interessante a comparação com Belo Horizonte: mesmo sendo cidade grande, o meme “em ________ só existem três pessoas: eu, você e o nosso conhecido” é usado pelos mineiros. E, depois de grandes nomes no cenário da música brasileira (recente), a cidade parece incapaz de gerar movimentos contundentes. E eis o contrapeso: tudo o que vem a ser notável passa a ser nivelado um pouco mais por baixo. E Grimes é uma artista filha dos anos 90 sem ser anos 90. Sabe dos anos 80 por causa – e só por causa disso – dos 90. É uma coletânea atual. Mas não dos tempos atuais. É um tributo ao random das possibilidades da música pop. No final, o resultado é um cego (atirando) no tiroteio. O grande problema é que esses cegos atiram com bala de festim. Fosse umas AK-47, seria uma perda de tempo mais violenta.

“Visions” é um disco acima da média: média de Montreal; média de Vitória. Depois de um tempo, já não parece mais com nada específico e sim com um amontado de tudo o que você já ouviu enquanto bebia cerveja a seis reais ouvindo a dj-setlist do seu amigo na casa alternativa da sua cidade. Lendo por aí, tu vai enxergar adjetivos como “misterioso”, “etéreo”, “indecifrável”, “transparente” e “sobrenatural”. No fundo, no fundo, parece resultado da indecisão dos ouvintes desse disco, uma vez que não sabem em que ambiente colocá-lo: na pista de dança, ninguém dança; no rádio, ninguém canta junto; em casa, incomoda.

Se eu pudesse encontrar com Grimes, certamente lhe mostraria Danilo Miranda. Com extrema precisão pop (sem muita dimensão da própria precisão), cravou o “É estranho sentir saudade de algo o qual mal vivi ou evitava viver”. Não se sabe da onde veio, mas pr’onde foi. Grimes, no entanto, veio e todo mundo sabe o porquê. Nada pode ser tão indecifrável assim. Ainda mais quando gerido na Lab Synthèse, extinta casa alternativa de Montreal.

A melhor música do disco tem 1:36 e abre o álbum (“Infinite ♡ Without Fulfillment”). A segunda tem 6:09 e quase fecha o álbum (“Skin”). Ouça agora, antes que te bata a saudade de descobrir algum outro futuro com um gostinho de pastiche.