[30-21] [20-11] [10-01]
De cara no dream pop, o Chromatics se meteu numa encruzilhada de acordes e pausas para criar canções reflexivas. As arestas de “Kill for Love” são podadas com camadas eletrônicas e filtros que fazem a voz soar na mesma frequência dos instrumentos. A toada do disco é urbana, artificializando para sensibilizar. A paisagem da crise de “These Streets Will Never Look The Same” é a TV ligada 24/7 no quarto. E não adianta ficar mal ou ébrio, isso não soluciona os problemas se a agonia só espanta a solução. Imagens polivalentes no maior álbum indie do ano em uma hora e meia de música sem parecer filler não é para qualquer um. (Túlio Brasil)
Psicodelia é sempre viagem, mas não é sempre que o itinerário dá tão bem e tão certo. Pelas versões preguiçosas do gênero que têm se alastrado nos últimos tempos, parece que bastaria um tanto de efeito e pouquíssimo de sentido pra fazer um disco viajandão, maluco, piradinho. Kevin Parker, no entanto, por mais que aparentemente fume quilos e quilos de maconha por ano, nào é um hippie à deriva esfumaçada, em questão de som: é um piloto, e, como tal, tem um destino. Os caldos grossos de sintetizador, os vocais como se tivessem passado por um pedal de wah wah e as linhas de guitarra cheias de curvas são apenas as piruetas de uma aeronave, cavalos de pau aéreos que ele resolve dar no caminho de volta pro quarto. “Lonerism” tem o tipo de psicodelia que Lennon – canalizado muito bem pela garganta de Parker – fazia nos anos 1960: meditações ganchudas, canções de pé no chão e cabeça nas nuvens. (Rafael Abreu)
Há uma metáfora já um tanto batida que tenta equiparar o tratamento vintage de certos álbuns com o usado por pessoas no Instagram, mas essa metáfora é pejorativa na maioria das vezes: a pessoa não é uma boa fotógrafa e a foto chama atenção demais. No caso, o músico poderia ser mediano que o tom vintage resolveria. Em 2012, “2” é um dos poucos álbuns que fogem (bem) disso por causa da habilidade de Mac Demarco em compôr canções que exploram um certo voyeurismo do cotidiano e destaca seu poder de criação e observação. Você conhece a mãe na cozinha, o irmão dando rolé de skate, o pai cuidando da vizinhança. No fim, você está íntimo e são as escolhas musicais do canadense presentes em “2” que permitem isso. (Yuri de Castro)
Como fica explícito num dos significados da palavra escolhida para o título, esse é um trabalho que foi feito para atingir a máxima beleza. A boa notícia é que “Bloom” é exatamente o que Victoria e Alex almejavam. O Beach House é uma joia envelhecida que Victoria e Alex Scally foram polindo até chegar no brilho intenso de canções como “Lazuli”. O que também demonstra o quanto a dupla parece se agarrar a uma ideia bastante específica do que é bonito. Numa era em que os artistas são quase que obrigados a mudar seu som a cada tweet, permanecer é uma ideia tão arriscada quanto se transformar. (Livio Vilela)
06.Japandroids
Celebration Rock
Da primeira vez que ouvimos falar de Japandroids, eles estavam nos explicando como “nós costumávamos sonhar, agora nos preocupamos com a morte” – e não é como se muito tivesse mudado desde então. No entanto, se “Post-Nothing” e “Young Hearts Sparks Fire” eram sobre a merda que é essa sensação de eterna crise “bons tempos” que parece acometer nossa geração, “Celebration Rock” traz no título uma outra possibilidade. O que eles estão dizendo é culpem quem vocês quiserem – nossos pais, a internet, a MTV – por nossa preguiça e melancolia geracional, nós ainda ainda estamos vivos e saudáveis e provavelmente vamos permanecer assim por muito tempo. É um corte na raiz do cinismo que musicalmente se traduz na mais compacta, despretensiosa e melhor coleção de canções de rock-rock desde o último bom álbum do Hold Steady (quando foi isso?). Rock de celebração, um título bem apropriado. (Livio Vilela)
As pessoas ouvem o que o Liars tem para dizer, as pessoas olham o que o Liars tem para mostrar e tudo se resume a uma palavra: tensão. Reducionista e preguiçoso como parece ser, o apodo “disco eletrônico do Liars” é, ainda assim, bem revelador do que o ouvinte encontra. Influenciados ou em confluência cósmica, o grupo se encontra com o Radiohead em passagem idêntica quando saíram do rock de “Ok Computer” para o eletrônico em “Kid A”. A questão da tensão como força motriz não impede que a aproximação com a eletrônica resulte em passagens relativamente amigáveis. O single “No.1 Against the Rush”, por exemplo, é uma clareira na constante de escuridão. Alguns momentos de “WIXIW” mostram que eles estão prontos para a paz, também. Só que o Liars vai sempre preferir a tensão. Talvez porque, assim, se tornou um dos grupos mais curiosos, consistentes e importantes da música americana atual. (César Márcio)
04.Fiona Apple
The Idler Wheel…
“The Idler Wheel”, como um disco em que toda uma carreira se realiza, é um trabalho cuja força vem justamente do limiar em que Fiona Apple se empoleirou, há dezesseis anos: o ponto em que a confissão se torna arte e o particular se faz universal. Com a própria voz, um tanto de batidas esparsas, outro tanto de instrumentos de câmara e um piano, Fiona escava, em canções enganosamente comuns, o extraordinário do coração partido. Desprovido de uma produção ostensiva, este é, talvez, o álbum mais nu que lançou, e é também o mais preciso, no jogo de se despir que Fiona faz há tanto tempo. Talvez seja difícil perceber isto, em tempos em que a regra é se desavergonhar em redes sociais, mas a beleza de um disco como esse é que, no processo de virar a própria alma do avesso, a cantora saiba exatamente o que mostrar e o que esconder. (Rafael Abreu)
Quem diria que toda anormalidade do Odd Future seria coadjuvante para Frank Ocean. Acima de escatologias e da atitude peculiar dos rappers, o jovem coletivo de hip-hop trouxe o talentoso crooner para dentro do mainstream. É fácil criar um disco pela estética sem justificativa, quando o conteúdo não banca o produto. O álbum de Frank Ocean tinha tudo para cair nessa: vem na ressaca da popularidade do Odd Future e chegou imediatamente após o cantor assumir a bissexualidade. Acontece que a música que tocou em rede nacional americana, “Bad Religion”, é linda, e o disco é verdadeiramente feito de ótimas canções. “Channel Orange” traz um R&B sacral permeado por flows de rap bem solucionados em monólogos. Frank desabafa num tom que muita gente fala que é brega, cria referências com franqueza e canta demais. (Túlio Brasil)
02.Dirty Projectors
Swing Lo Magellan
“Swing Lo Magellan” é o disco em que um artista, David Longstreth, quase sempre ligado ao hermetismo, ao críptico, ao estranhamento decide simplesmente “fazer canções”. A ideia de fazer canções aqui é levada a sério e tem seu sentido mais estrito: Longstreth compõe, canta, arranja e escreve suas letras com sinceridade absurda. Ao fazê-lo, não apenas demonstra que seu talento e sua lucidez vão muito além da técnica e da fuga dos lugares comuns que sempre representaram a música do Dirty Projectors, mas também – e aqui vale repetir como ele o faz: com canções honestas e sinceras – Longstreth joga luz na futilidade e frivolidade da música pop atual. Ouvir “Swing Lo Magellan” e prestar atenção na maneira como Lonsgstreth é franco e verdadeiro com seu ofício e arte faz com que reconheçamos sua excelência, assim como a falsidade reinante na música do nosso tempo. (Matheus Vinhal)
Há muito o que falar sobre “Shields”. Ou não há nada. Das muitas melodias bem alinhavadas, dos acertos a cada instante, da absurda e quase sufocante ausência de equívocos, da beleza aterrorizante de cada instrumento, voz, ruído, ambiência: há pouco a se falar. O que há para tudo isso é o paradoxal silêncio que o encanto com “Shields” gera. Continuando um projeto que começa em “Yellow House” (2006) e amadurece em “Veckatimest” (2009), o que o Grizzly Bear faz com impressionante sucesso e excelência em seu último disco é um andar no escuro da música, jogando a luz difusa dos seus discos anteriores no semi-desconhecido que é “Shields”. É como caminhar impecavelmente na escuridão da própria sala de estar, a prataria toda exposta, a perna do sofá pronta para o dedo do pé. E nada: nenhum arranhão. O Grizzly Bear trabalha a serviço do belo, do prazer estético, sem torná-los vazios nem abandonar o conceito. E faz o disco mais bonito de 2012, onde há espaço tanto para a nuance quanto para a melodia simples e envolvente; para a experimentação e para o porto seguro da canção; para o alvoroço do ruído e o recanto do silêncio. (Matheus Vinhal)